É extremamente difícil ascender socialmente no Brasil se você não vier de uma família de posses. O país está na 60ª posição entre 82 economias em um ranking de mobilidade social divulgado nesta semana pelo Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês), cujo encontro anual vai até o dia 24 em Davos, na Suíça.
O Índice Global de Mobilidade Social considera 10 pilares: qualidade e equidade da educação, acesso à edução, saúde, instituições inclusivas, proteção social, condições de trabalho, distribuição justa de salários, oportunidades de trabalho, acesso à tecnologia e aprendizado ao longo da vida.
“Crianças nascidas em famílias menos abastadas tendem a experimentar maiores barreiras para chegar ao sucesso do que aquelas nascidas em famílias mais abastadas. Essa desigualdade de oportunidades podem se tornar arraigadas e promover desigualdades econômicas de longo prazo, bem como profundas divisões econômicas e sociais”, diz o texto.
Os sete primeiros países do ranking são todos escandinavos: Finlândia, Noruega, Suécia, Dinamarca e Islândia. Entre as economias do G7, a Alemanha é a campeã, no 11º lugar, seguida pela França, no 12º
A Rússia é a líder em mobilidade social dentro do BRICS, ocupando a 39ª posição geral. Em seguida vem a China, na 45ª posição, seguida pelo Brasil (60ª), Índia (76ª) e África do Sul (77ª). Os últimos lugares no ranking são de Paquistão, Camarões, Senegal e Costa do Marfim.
Brasil
A nota do Brasil no relatório do WEF foi 52,1 em uma escala que vai até 100. A nota do primeiro lugar do ranking é 85,2. Dos pilares considerados, aquele onde o Brasil teve a pior nota foi “Distribuição Justa de Salários”.
O WEF destaca a incidência de baixos salários no mercado de trabalho brasileiro, a alta incidência de trabalhadores em condições vulneráveis de emprego (27,4%) e há alta proporção de jovens que não estão empregados nem estudando (24,1%).
“Esforços adicionais poderiam ser feito para diminuir os níveis de desemprego entre os trabalhadores com educação básica (15,3%) e intermediária (14,1%)”, diz o texto.
Melhorar o acesso a oportunidades de aprendizagem ao longo da vida dos cidadãos também levaria à redução dos níveis de desemprego no país, destaca o estudo.
Nos pilares “Acesso à Educação” e “Qualidade e Equidade da Educação”, o país tem 54,2 e 42,2 pontos, respectivamente.
O relatório destaca que o o Brasil tem uma alta taxa de matrículas na pré-escola (86,5%), mas também uma alta proporção de crianças que chegam aos 10 anos com proficiência mínima abaixo do esperado (46,9%).
“Menos alunos por professores nos ensinos pré-primário, fundamental e médio poderia ser um caminho para reduzir a deficiência na aprendizagem”, sugere o documento.
Uma das medidas de mobilidade social usadas pelo relatório calcula quantas gerações, em média e com todo o resto constante, levaria para uma família de baixa renda atingir a renda mediana da sociedade. Na Dinamarca, são duas e na França, seis. No Brasil e na África do Sul, são nove gerações.
O relatório também aponta uma relação estatística forte, em que países com alta desigualdade de renda também tem baixa mobilidade social.
A curva foi apelidada de “O Grande Gatsby” em referência ao romance que se tornou símbolo do fosso social nos anos 20, e mostra como a desigualdade e a baixa mobilidade são fenômenos que se retroalimentam em um círculo vicioso.
De acordo com o economista Daniel Duque, o Brasil sustenta uma posição tão ruim no ranking porque ainda está longe de garantir direitos básicos aos seus cidadãos.
“(Falta aqui) educação de qualidade para os mais pobres, uma renda que permita a funcionalidade familiar em domicílios de extrema pobreza, oportunidades de empregos de qualidade em todas as regiões e o fim da discriminação de gênero e cor/raça, tanto no mercado de trabalho quanto nas normas sociais”, diz.
Estudo do economista Marcelo Neri, do FGV Social, de agosto do ano passado mostra que o Brasil passa por uma escalada na desigualdade desde o começo de 2015. Na data da divulgação do levantamento, a desigualdade de renda aumentava há 17 trimestres consecutivos, o maior período já documentado.
“Nem mesmo em 1989, que constitui o nosso pico histórico de desigualdade brasileira, houve um movimento de concentração de renda por tantos períodos consecutivos”, destacou o estudo feito com base em dados da PNAD Contínua do IBGE.
O período corresponde ao auge da crise econômica, com queda acumulada do PIB na ordem de 8% no acumulado de 2015 e 2016, e também abarca a tímida retomada registrada em 2017 e 2018.
A acentuação da globalização e as mudanças tecnológicas são frequentemente culpadas pela desigualdade, mas a trajetória diferente entre países mostra que entre os culpados também estão “a má elaboração de políticas, e é responsabilidade de várias partes interessadas corrigi-las”, diz o WEF.
Fonte: Exame