A forte aposta dos investidores na queda ainda mais intensa da Selic está sendo desmontada em meio à postura de cautela do Banco Central. O ajuste das carteiras, que anulou a precificação da taxa básica abaixo de 4,50%, provoca pressão de alta sobre os contratos do meio da curva – e existe, inclusive, uma elevação de juros embutida nos contratos a partir de meados do próximo ano.
Semanas atrás, o posicionamento dos investidores indicava que a Selic poderia cair dos 5% atuais até 4%.
A reviravolta deve-se a uma série de fatores. A ausência de fluxo da cessão onerosa, após a frustração com o leilão dos campos de pré-sal no início do mês, fizeram o dólar superar R$ 4,20. Na semana passada, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que, caso o câmbio afete a inflação, terá de mudar a política monetária.
A perspectiva de crescimento econômico mais firme, os acontecimentos recentes de crises e protestos na América Latina, a alta do preço da carne e da energia elétrica e a libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também levaram o mercado a ajustar as posições.
Tudo isso num ano em que as carteiras já mostram resultados positivos, sem a necessidade, portanto, de tomada de mais risco no final do ano.
“O mercado não está fazendo muita conta, está desalavancando o posicionamento em juros”, disse Ricardo Cará Monteiro, da gestora Macro Capital. “A indústria de fundos começou a tirar o pé da curva.”
O mercado veio de um ciclo forte de queda nas taxas e inflação abaixo do esperado, diz Carlos Menezes, gestor da Gauss Capital. “Com a proximidade do fim do ano, a liquidez dos mercados se reduz, o que dificulta e amplifica os movimentos das eventuais reduções de risco.”
O contrato de juros futuros de janeiro de 2023 acumula 47 pontos base de alta no mês, enquanto o DI de janeiro de 2024, 46 pontos. É um desempenho bastante diferente dos contratos curtos: no mesmo período, o DI janeiro de 2020 recuou oito pontos, enquanto o janeiro 2021 subiu apenas 14 pontos.
Estrangeiros
A reversão da posição de queda dos juros tem sido principalmente executada por parte dos investidores estrangeiros, diz Luis Laudísio, operador de renda fixa da Renascença.. “Os locais, por estarem já posicionados, pela proximidade do final do ano e pela performance até então, estão preferindo manter suas posições a adicionar mais risco às carteiras, colocando em risco o bom ano. Justamente por isso, parece estar ‘tão fácil’ puxar as taxas.”
Para Menezes, da Gauss, o estrangeiro está bem mais reticentes em alocar recursos no país antes que o resultado das reformas comece a ser visto na prática. “Ele não quer pagar para ver. Prefere entrar posteriormente mas com um risco menor.”
Crescimento
A pesquisa Focus divulgada pelo Banco Central trouxe novas revisões em alta da projeção para o PIB no próximo ano de 2,17% para 2,20%, uma expansão esperada mais animadora do que a de 2019, prevista em 0,99%.
“O principal driver é o crescimento e a grande dúvida em debate é quão forte ele será”, diz Luis Otavio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil. A possibilidade de fechamento do hiato do produto traz em sua esteira o risco de se elevar os juros em algum momento nos próximos anos.
Fonte: Exame