A taxa de investimento no Brasil, somando setores público e privado, está no seu menor nível dos últimos 50 anos.
No primeiro trimestre de 2019, a proporção do que o país investe em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) foi de 15,5%, cinco pontos percentuais abaixo da taxa registrada nos anos anteriores à crise (2010 a 2014).
Os dados são de um levantamento recente dos economistas Marcel Balassiano e Juliana Carvalho da Cunha Trece, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
A situação, segundo Balassiano, foi agravada pela “pior recessão dos últimos 120 anos”, registrada nos anos de 2015 e 2016, mas o fato é que o investimento é historicamente baixo no Brasil.
Dos anos 80 para cá, quatro países latino-americanos (Chile, Colômbia, México e Peru) tiveram uma média de investimento de 22,3% do PIB enquanto a taxa de investimento do Brasil foi de 18,8%.
O auge do investimento no país foi de 25% do PIB, registrado no fim da década de 80. “Mesmo quando a gente estava bem, a gente estava mal”, resume Balassiano.
Nos anos 80 e 90, cerca de 70% dos países investiam proporcionalmente mais do que o Brasil. Em 2018, esse número subiu para 88,4%, de acordo com dados do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Um levantamento do economista Manoel Pires, também do Ibre/FGV, vai na mesma linha ao mostrar que os investimentos públicos, em porcentagem do PIB, apresentam tendência de queda desde o final dos anos 1970. Em anos recentes, a taxa foi de 4,06% em 2013 para 1,85% em 2017 e 2,43% em 2018.
Mas o que impede o país de investir? Do lado público, falta espaço no Orçamento. Do privado, falta previsibilidade e confiança no futuro.
“O grande problema do país hoje é o fiscal. Voltamos a ter déficit primário (gastamos mais do que arrecadamos) desde 2014. A dívida passou de 50% do PIB em 2013 para quase 80% hoje em dia”, diz Balassiano.
Em entrevista a EXAME durante a campanha presidencial do ano passado, Pérsio Arida, coordenador do programa econômico de Geraldo Alckmin (PSDB), dizia não ver solução no curto prazo: “investimento público direto não tem e não terá”.
Na mesma série de entrevistas, Gustavo Franco, que coordenou o programa de João Amoêdo, do Partido Novo, dizia acreditar que o setor privado poderia ocupar plenamente o vácuo do setor público.
“Nas áreas de infraestrutura, onde falta investimento, o setor privado pode atender plenamente. Hoje em telecomunicações, por exemplo, praticamente tudo é setor privado, enquanto no saneamento é tudo setor público, porque o desenho torna difícil para o setor privado entrar”.
Paulo Vicente, professor de estratégia da Fundação Dom Cabral, diz que a tarefa do governo deve se restringir a alguns setores dos quais não pode abrir mão, como segurança pública, e onde não haja interesse do setor privado, o que depende de uma série de fatores.
Problemas como burocracia, complexidade tributária e trabalhista, contencioso judicial e dificuldade para abrir e fechar empresas são citados comumente por empresários como obstáculos para o investimento.
Apesar de ter subido 16 posições no último ano, o Brasil está no 109º lugar entre 190 países no ranking global de ambiente de negócios do Banco Mundial.
O que dá para fazer
Em agosto de 2018, antes das eleições, o mesmo Banco Mundial lançou uma nota recomendando que o investimento público fosse excluído da lista de despesas sujeitas ao teto de gastos.
Segundo a instituição, o avanço das despesas obrigatórias, como benefícios previdenciários e salários de servidores, deixa pouco espaço para investimentos que poderiam alavancar o potencial de crescimento.
Em relatório anterior, o banco já havia alertado que o Brasil precisava criar espaço fiscal para investimento em infraestrutura. Uma flexibilização do teto, no entanto, só poderia acontecer acompanhada de um ajuste mais duro nas contas.
Para o economista Claudio Frischtak, presidente da consultoria InterB, qualquer mudança seria temerária: “Se quiser apressar o nosso suicídio é bom mexer nos tetos e gastos”, afirma.
Para reverter o baixo nível de investimentos no país, Frischtak propõe uma agenda focada em fortalecimento da segurança jurídica no Brasil e a redução da imprevisibilidade regulatória. A ideia é que para ficar mais confortável, o investidor precisa ter um horizonte claro de planejamento.
Um exemplo que ele cita é a interferência nas agências reguladores nos últimos governos e no atual. Uma lei recente sobre o tema foi sancionada por Bolsonaro, mas com veto a um ponto que instituía uma lista tríplice para cargos de comando.
Segundo o governo, a medida restringia “a competência constitucionalmente conferida ao chefe do Poder Executivo” para fazer as indicações dos dirigentes.
“O que eles não consideram é que isso aumenta o prêmio de risco regulatório. Ou seja, as empresas esperam maiores retornos, que incluam o risco do investimento”, diz Frischtak.
Vicente, da Dom Cabral, acredita que o setor público precisa se reinventar e que isso não vai acontecer de um dia para o outro.
“Vai ter que abrir mercado para esses estrangeiros virem para cá. Tem trilhões de dólares amargando juros muito baixos no Japão e nos Estados Unidos. Mas as garantias de longo prazo são limitadas”, diz.
Ele destaca que há um histórico de instabilidade que assusta o investidor e lembra da suspensão de pagamento dos juros da dívida externa feita pelo então presidente José Sarney em 1987:
“Faz 30 anos do calote, mas para quem investe por longos períodos, isso foi ontem”, diz ele. Agora é torcer (e trabalhar) para que os 30 anos seguintes sejam mais auspiciosos.
Fonte: Exame