A queda nas taxas de juros dos papéis mais longos do Tesouro Nacional trouxe ganhos extraordinários para quem aplicou nesses papéis, em alguns casos de mais de 60% em 12 meses. Mas a tendência agora é de estabilidade ou ganhos bem menores, proporcionais à queda dos juros.
Com isso, a rentabilidade desses títulos, especialmente os atrelados à inflação, deve ser menor, avalia Joaquim Kokudai, gestor da JPP Capital. “Acho que até é hora de quem tem esses papéis mais longos há mais tempo vender e investir em outra coisa”, afirma ele.
As NTN-B longas, ou Tesouro IPCA+, com prazos até 2035 e 2045, pagam hoje cerca de 3,9% ao ano mais inflação. “Elas podem chegar a 3,5% ao ano, o que pode dar um ganho extra para o investidor, mas não vale muito a pena o risco com base nesse ganho”, diz o gestor.
Para Kokudai, a economia hoje está fraca e a inflação tranquila porque há muita insegurança com relação às reformas. “Se a Câmara aprovar a reforma da Previdência, o juro pode cair, mas você vai ter um efeito na economia mais forte e uma retomada mais consistente, que pode pressionar os preços no ano que vem”, afirma. E como o juro está baixo em termos históricos, o risco de um aumento mais adiante é grande, explica.
Para um investidor pessoa física que está pensando em uma aplicação de longo prazo para aposentadoria, o juro real das NTN-B longas ainda pode ser considerado interessante se comparado ao de outros países, admite Kokudai. Mas há opções melhores, com prêmios mais altos, como papéis emitidos por empresas, o chamado crédito privado, e mesmo a renda variável, ou seja, a bolsa de valores.
O real também pode se valorizar diante do dólar caso a reforma seja aprovada. “Podemos ter agora uma dinâmica diferente, de o mundo indo mal e o Brasil, bem, o que faria o real se valorizar diante do dólar”, diz o gestor. Nesse caso, fundos multimercados podem ser alternativa, já que os gestores devem estar se preparando para ganhar com esse cenário.
Com essa visão, o fundo de previdência da JPP, o SulAmérica Effectus, está aplicando mais em bolsa de valores e na queda do dólar.
O cenário externo, de desaquecimento da economia mundial, também ajuda a manter o dólar mais comportado. “O juro do título de 10 anos do Tesouro dos EUA está pagando hoje 2,08%, depois de quase chegar a 3%”, lembra.
Ações da Vale e voltadas ao mercado local
Na renda variável, Kokudai vê oportunidades nas ações da Vale, que sofreu com tragédia de Brumadinho, mas tem valor. Mas ele acha que é preciso olhar para empresas voltadas para o mercado local. Os banco já estão um pouco caros, e deve sofrer com as mudanças no setor, com a entrada das fintechs e mudanças na forma de fazer operações. “Daqui a 10 anos, os bancos não vão entregar todo esse lucro de hoje”, afirma o gestor.
Mas o varejo ainda tem espaço para crescer com a retomada do crescimento da economia. Petrobras também faz parte da carteira do fundo, pois está sendo bem administrada e suas ações estão em patamar razoável. E há empresas de construção voltadas para a baixa renda, como a Tenda, que com a melhora da economia deve encontrar demanda grande. “Mas o foco deveria ser em setores locais que vão se aproveitar de retomada local que externas”, diz..
Já Claudio Cesar Sanches, diretor de Produtos e Soluções para Investidores do Itaú-Unibanco, diz que a instituição continua com uma visão positiva de bolsa e fundos de renda variável. “Temos uma boa recomendação para quem tem um apetite de risco um pouco maior, pessoas com perfis mais arrojados, agressivos”, diz. “Para eles, renda variável é bela opção.”
Busca por renda fixa diferente
Já para o investidor mais conservador, a busca por alternativas na renda fixa é a opção diante da queda dos juros. Mas Sanches alerta que é preciso tomar muito cuidado com movimentações que estão acontecendo no mercado. “Tem muita oferta de crédito, e crédito não é ativo sem risco, como os títulos públicos, apesar de oferecer ganhos maiores”, lembra.
A sugestão é que o investidor dê preferência para aplicações diversificadas, via fundos, que podem diluir o risco de perdas. “Lançamos três fundos de crédito recentemente, mas orientamos os clientes que eles devem ser aplicações de longo prazo, como diversificação, não são para o caixa, apesar de terem liquidez diária”, diz.
O risco é esses papéis sofrerem algum problema como alta dos juros ou mesmo inadimplência de uma empresa. “E o investidor vê o fundo rendendo como reloginho, 100% do CDI, acha que é um fundo DI, sem risco, e não é”, afirma.
Outra opção para clientes conservadores além dos fundos de crédito são papéis isentos, como Certificados de Recebíveis, do Agronegócio (CRA) ou imobiliários (CRI), que têm a garantia dos recebíveis.
Fundos de debêntures de infraestrutura
Há também os fundos de debêntures incentivadas, de empresas de infraestrutura, que são isentos de imposto no rendimento, assim como os papéis comprados diretamente. O Itaú prepara para breve o lançamento de suas primeiras carteiras de debêntures incentivas e acompanha quatro carteiras de terceiros no mercado para oferecer aos seus clientes. “Vamos ter fundos de terceiros e também gestão própria”, afirma.
Fundos de debêntures com ou sem hedge
Ele explica que há dois tipos de fundos de debêntures, um com hedge, que atrela o rendimento da carteira ao juro do CDI e reduz oscilações com a flutuação dos juros, e os sem hedge, que oscilam com mais força e são recomendados para aplicações de maior prazo. “Devemos ter os dois tipos”, diz. “Entendemos que os fundos de debêntures são a próxima classe de fundos que deve crescer acima da média de mercado”, afirma, citando a vantagem tributária que permite ao papel entregar um pouco mais de rentabilidade líquida.
Essa vantagem fiscal é importante quando se nota que a rentabilidade dos papéis de crédito vem caindo, com a baixa dos juros e a procura maior por parte dos investidores em busca de isenção, diz. “Muitas empresas estão emitindo debêntures para melhorar o perfil da dívida com juros menores, mas mesmo assim acabamos recomendando esses papéis pela diversificação”, explica Sanches. A isenção também ajuda a melhorar o resultado final para o investidor, mesmo com um juro mais baixo.
Investidor em ações mais preparado
O executivo acredita que a queda dos juros levará a uma diversificação maior e o investidor terá de se acostumar com maiores oscilações de seus ativos, mesmo na renda fixa.
Hoje, porém, ele vê os investidores em ações mais preparados para as oscilações de seus rendimentos do que em renda fixa. “Quem investe em ações entende melhor os riscos, já sabe o que quer e fica preparado para uma eventual perda, mas na renda fixa, o investidor conservador fica olhando esperando um reloginho e quando há alguma marcação mais forte de algum papel acaba resgatando em um momento ruim”, explica.
Por isso, o banco toma muito cuidado com a indicação de carteiras de papéis mais longos e de risco mais alto.
Sanches acham também mais fácil explicar para um investidor o funcionamento de um fundo de debêntures. “É uma dívida de uma empresa, então é mais fácil de entender”, diz.
Sobre o Tesouro Direto, o executivo lembra que a queda dos juros foi compensada em parte pela isenção de tarifas pelos bancos e corretoras. “Se tivesse taxa, seria mais difícil para o investidor”, diz.
Investidor em ações voltando
Ele vê os investidores aos poucos voltando a investir em fundos de ações. “O mercado ficou por muito tempo com o pé atrás com ações”, diz Sanches. “As pessoas sofreram bastante com ações e ainda têm um cuidado grande em investir, especialmente o conservador e moderado”, afirma. Nesses casos, a saída é um fundo multimercado, que aplica em ações, mas numa parcela menor.
Diversificação em ações
Para Sanches, a tendência de crescimento dos fundos de ações deve continuar e, com ela, a busca por outros tipos de estratégias. Por isso, o banco está trazendo novas gestoras para a clientela, como as carteiras de ações mais especializadas Moat Capital e Neo Navitas. “Temos também fundos multigestores que fazem uma seleção dos melhores fundos e analisam seus riscos e sua consistência de resultados”, afirma. Segundo ele, não basta o fundo ir bem. “Ele tem de ganhar naquilo que o gestor esperava, não pode ser por sorte”, diz.
Assim, a tendência é de crescimento das aplicações em renda variável pelo cenário positivo. Já o crédito privado tende a aumentar pois é classe que tinha pouca presença nas carteiras, mas dentro de um quadro de maior diversificação de risco e liquidez. E multimercados, com bons gestores, que cresceram muito nos últimos dois anos, continuam sendo opção. “Mas renda variável e crédito devem roubar um pedaço desse mercado”, acredita Sanches.
Fonte: Exame