Em mais uma troca de cadeiras, a Ambev (ABEV3) anunciou na última terça-feira (27) que o executivo Carlos Lisboa se tornará presidente da companhia a partir do início do próximo ano, no lugar de Jean Jereissati. A mudança surpreendeu muitos analistas de mercado, mas não traz a visão de grandes alterações na estratégia.
Lisboa atualmente preside a região “Middle Americas Zone (“MAZ”) na Anheuser-Busch InBev (ABI), controladora da Ambev, sendo membro do conselho de administração da cervejaria brasileira.
Jereissati, que é presidente-executivo da Ambev desde 2019, vai assumir o posto de Lisboa na MAZ, disse a Ambev, que no mandato de Jereissati reforçou apostas no segmentos de venda por aplicativos junto aos consumidores e lojistas e estratégia de foco em suas marcas premium.
Na visão da XP, uma vez que a rotação de executivos está incorporada à cultura da ABI, a projeção é de que não haja nenhuma ruptura no dia a dia das empresas. “Embora não seja esperada, a ampla experiência de Lisboa, incluindo sua função atual como CEO da maior operação de volume da ABI e cargos anteriores como CMO [diretor de marketing] da Ambev e VP de Marketing para as marcas globais da ABI, sugere continuidade nas iniciativas estratégicas recentes”, apontam os analistas Leonardo Alencar, Pedro Fonseca e Samuel Isaak.
Para os analistas, os esforços contínuos da AmBev para otimizar seu portfólio e aumentar o reconhecimento da marca provavelmente persistirão sob a nova liderança, esperando uma reação neutra para as ações à mudança de CEO.
O Itaú BBA prevê uma transição suave, sem impactos nas operações da Ambev, e a continuidade da estratégia de longo prazo sem interrupções.
O Bradesco BBI apontou ter ficado surpreso com este anúncio, mas diz que definitivamente a troca não quer dizer que a troca de assento seja algo novo na cultura que está em vigor na Ambev e na ABI ao longo de suas respectivas histórias.
“O mandato médio do CEO da Ambev é de 5 anos e o grupo sempre buscou encontrar espaço para executivos de alto desempenho continuarem desenvolvendo suas carreiras”, apontam os analistas. Com a Ambev e a MAZ sendo divisões altamente estratégicas para a ABI, os especialistas acreditam que este é exatamente o caso aqui.
“Jean está concluindo seu ciclo como CEO da Ambev, sendo a reviravolta que ocorreu na divisão de cervejas do Brasil da empresa como nada menos que impressionante. Durante a gestão de Jean, a cultura da empresa mudou significativamente para uma que adota uma mentalidade mais centrada no consumidor e sob a qual acreditamos que uma abordagem necessariamente mais orientada a longo prazo foi adotada para a construção da marca e para promover uma indústria de cerveja mais forte no país”, avalia o banco.
A lucratividade na divisão permanece longe de seus máximos históricos, pondera o BBI. Contudo, também vê que as preferências do consumidor mudaram drasticamente e o cenário competitivo também se tornou mais acirrado, o que leva o uso de margens históricas como referência podendo ser uma âncora injusta (o BBI acredita que o mercado já incorporou margens atuais às expectativas).
“Em vez disso, os últimos anos serviram para melhorar materialmente a posição competitiva da Ambev sob esse novo cenário da indústria, com a empresa agora ostentando um portfólio mais forte de marcas, uma participação de mercado recuperada (os volumes de 2024 estão 18% acima do pré-pandemia) e margens que finalmente atingiram o fundo do poço”, avalia o banco.
O lançamento bem-sucedido da plataforma B2B BEES e do Zé Delivery também serviu para aproximar a Ambev de seus clientes e consumidores, segundo os analistas.
Desafios e oportunidades
Sobre Lisboa, durante sua gestão como presidente da MAZ, a divisão cresceu e passou a representar 25% dos volumes totais da ABI e 39% de seu Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) consolidado, reforça a equipe de analistas do BBI.
“Sua história no grupo envolve um cenário de marketing e construção de marca, o que acreditamos estar diretamente relacionado aos desafios (e oportunidades) que a Ambev deve continuar a enfrentar. Em 2020, agências de notícias também relataram que Lisboa estaria supostamente na lista para substituir Carlos Brito como CEO da ABI. No passado, investidores questionaram a Ambev por ser principalmente uma exportadora de talentos para a ABI, mas as chegadas de Jean em 2019, Lucas Lira como CFO em 2020 e, agora, Lisboa, também devem mitigar essa resistência anterior”, avalia o BBI.
No geral, a equipe de análise espera que a mensagem para a Ambev seja de continuidade em relação às prioridades estratégicas que estão em vigor nos últimos anos.
O Goldman Sachs aponta que o anúncio de um novo CEO pode ter sido sim uma surpresa para alguns investidores, em face das contínuas melhorias culturais entregues pelo atual CEO, mas está em linha com os ciclos de rotação interna da AB InBev em sua liderança executiva.
“A maior parte dos desafios que prevemos para a Ambev nos próximos 2-3 anos são de fatores externos, como concorrência, câmbio, macro e, finalmente, avaliação, de uma forma que o anúncio faz pouco para mudar nossa visão sobre as ações. Dito isso, o novo CEO assumirá a liderança da Ambev em um momento em que a empresa está avaliando abertamente novas estruturas de capital, e estamos ansiosos para ver como as contribuições de Lisboa de sua gestão na AB InBev e no Grupo Modelo podem impactar esse processo”, aponta o Goldman, que tem recomendação de venda para ABEV3, com preço-alvo de R$ 11,20, ou queda de 14% em relação ao fechamento da véspera.
O Itaú BBA e o Bradesco BBI possuem recomendação marketperform (desempenho em linha com a média do mercado, equivalente à neutra) para ABEV3, com preços-alvo respectivos de R$ 14 (upside de 7%) e R$ 13 (estabilidade frente o fechamento de terça).
(com Reuters)
FONTE: INFOMONEY