Um mercado de capitais mais forte no Brasil poderia criar 1,7 milhão de empregos a mais e aumentar em 11,6% a renda per capita do país ao longo de cinco anos. As estimativas fazem parte de um estudo feito pela consultoria Accenture Strategy e representam uma pequena amostra do impacto real que a implementação de uma agenda para desenvolvimento do ambiente de financiamento privado de longo prazo poderia causar.
O levantamento feito pela consultoria para a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) e a B3 busca desvendar os efeitos palpáveis para a economia do fortalecimento e desenvolvimento do mercado de capitais. O estudo será apresentado hoje no Congresso Brasileiro do Mercado de Capitais 2018, em São Paulo.
Segundo o documento, possibilitar a empresas de vários tamanhos acessar fontes privadas para financiamento de longo prazo, além de aumentar a própria disponibilidade de recursos a um custo menor, ajudaria as companhias a viabilizar mais projetos e expandir a produção, o que impulsionaria criação de empregos e aumento da renda.
A pesquisa levou em conta a experiência internacional e os resultados alcançados a partir de medidas semelhantes às defendidas pela Anbima e B3. A existência de mercados de capitais desenvolvidos tem sido amplamente apontada como fator para o avanço socioeconômico dos países, pondera o estudo.
Cálculos feitos a partir dos dados de vários países mostram que a expansão dos mercados de ações e de títulos privados poderia levar a um aumento extra de 21%, ou R$ 294 bilhões, nos investimentos em infraestrutura entre 2018 e 2022 no Brasil. Apenas em saneamento, eletricidade, transporte e telecomunicações haveria R$ 89 bilhões adicionais. O estudo leva em conta um crescimento moderado da economia brasileira de 2% a 3% anuais, visto como mais provável pela Anbima nos próximos anos.
Outro efeito seria o aumento extra de 12% no PIB per capita, para R$ 38,8 mil em cinco anos. Sem nenhum impulso ao mercado de capitais, a Anbima prevê um PIB per capital de R$ 34,6 mil em 2022, ou seja, R$ 4 mil a menos.
No cenário moderado de crescimento, o estudo mostra que, se a agenda de desenvolvimento for implementada, o valor de mercado das empresas listadas em bolsa sairia de 52,4% do PIB neste ano para 73% do PIB em 2022. O estoque de títulos privados cresceria de 27,6% do PIB para 31,2% do PIB no mesmo período. Em cinco anos, diz a pesquisa, o mercado de capitais brasileiro cresceria R$ 3,7 trilhões. Em 2029, chegaria à mesma média de um grupo de países selecionados, com 130,4% do PIB em capitalização de mercado e 38,7% do produto em títulos privados.
"Trata-se de um estudo econométrico de experiências de países que adotaram uma agenda similar. A partir dele, queremos mostrar o que pode acontecer, em um ambiente de estabilidade macroeconômica, se o país desenvolver seu mercado de capitais", afirma José Eduardo Laloni, diretor da Anbima. Entre outros pontos, o trabalho também mostra que a variação de 1% no mercado teria impacto de 0,3% na renda per capita, percentual considerado relevante por Laloni.
O trabalho encomendado pela associação procura sensibilizar o futuro governo para a importância dos mercados de renda fixa e variável no desenvolvimento do país. Os dados estão sendo apresentados aos assessores econômicos dos candidatos à Presidência junto com uma agenda de propostas. As sugestões giram em torno de cinco metas: fomentar o financiamento privado de longo prazo, estimular a formação de poupança, expandir o volume de emissões e aumentar a liquidez da negociação de ativos.
Para a Anbima, a expansão do mercado de capitais é crucial num momento em que o BNDES reduz a participação no financiamento a empresas e projetos de infraestrutura, ao mesmo tempo que o acesso a crédito em canais tradicionais, como os bancos, permanece caro e escasso. "O BNDES está saindo gradativamente do mercado. É uma grande oportunidade para acelerar a participação dos recursos privados", diz José Carlos Doherty, superintendente-geral da entidade.
Gilson Finkelsztain, presidente da B3, avalia que o BNDES, sozinho, não dá conta de suprir a demanda por recursos no país. "Não há dinheiro bastante para isso. O ideal é que o banco atue como um intermediário para alavancar o setor privado no mercado de capitais", afirma.
Os números reforçam a percepção dos executivos. Com a melhora do cenário macroeconômico nos últimos dois anos, o mercado de capitais tem mostrado fôlego suficiente para ocupar o espaço deixado pelo banco estatal. Entre 2016 e 2017, a redução acumulada nos desembolsos do BNDES alcança R$ 65 bilhões, saindo de R$ 135,9 bilhões em 2015 para R$ 70,8 bilhões no ano passado. Em relação ao pico de financiamentos pelo órgão alcançando em 2013, a retração em 2017 sobe para R$ 119,6 bilhões.
Ao longo de 2017, porém, a captação de recursos por empresas brasileiras tanto no mercado de capitais doméstico quanto no exterior mais que compensou essa redução. No período, as corporações do país aceleraram as emissões de títulos de dívida e ações diante da retração do BNDES e das condições favoráveis tanto de custo de capital quanto de demanda. Com isso, conforme dados da Anbima, obtiveram R$ 307 bilhões, ou seja, R$ 122,2 bilhões a mais do que o total captado em 2016, excluindo-se os valores de emissões do Tesouro Nacional no período.
Em 2018 até julho, as emissões domésticas e externas já alcançam R$ 172,7 bilhões, incluindo a captação internacional de US$ 1,5 bilhão feita pelo Tesouro em fevereiro. O montante obtido no mercado doméstico registra avanço de 35,7% na comparação com os primeiros sete meses de 2017. No exterior, houve recuo de 26,3% no volume de recursos na mesma base de comparação.
Fonte: Valor Econômico