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Desemprego cai, mas aumento do trabalho informal dificulta retomada da economia

Sexta, 31 Agosto 2018

A entrada de trabalhadores no mercado informal ajudou a reduzir o desemprego e colocou um número recorde de pessoas na força de trabalho. Mas esse fenômeno, que à primeira vista pode indicar uma reação da economia, não se traduziu em melhora na produtividade.

Para especialistas, é mais um sintoma da fraqueza da atividade econômica e de sua lenta recuperação, refletidos no resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do país: no segundo trimestre deste ano, a economia do Brasil cresceu 0,2%, segundo dados divulgados nesta sexta-feira (31) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

No mesmo período, enquanto o desemprego recuou para 12,4%, o número de trabalhadores com carteira assinada foi o menor já revelado também pelo IBGE.

A explicação está no aumento da informalidade, que ganhou quase 1 milhão de pessoas. O mercado informal passou de 36,4 milhões um ano antes, para 37,3 milhões no trimestre encerrado em junho, alcançando 40% da força de trabalho.

Quem são os informais
Neste grupo, estão não só os trabalhadores sem registro e os domésticos sem carteira assinada, mas também os empreendedores por necessidade. São aqueles que, sem emprego, passaram a se virar em "bicos", prestando serviços ou vendendo mercadorias nas ruas ou pela internet.

São autônomos que não têm CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), ou trabalham por conta própria além de serem "patrões" de outras pessoas que trabalham sem registro em carteira.

Com a crise, estes empregadores também cresceram. O número de patrões sem CNPJ no país aumentou 10,5% em 1 ano, segundo a Pnad Contínua do IBGE.

No trimestre encerrado em junho, o número de empregadores informais chegou a 911 mil. Com isso, eles passaram a representar 20,8% dos patrões no país.
Para o economista do IBRE/FGV Fernando Veloso, quanto mais empresas na informalidade, maior a tendência de empregar trabalhadores sem carteira assinada.

'Negócio' em família

Após perder o emprego de padeiro, Reginaldo Nilson entrou nas estatísticas do trabalho informal ao virar vendedor ambulante. Aos 41 anos, ele 'emprega' mais três ajudantes da família. O trabalhador sai todos os dias de Guarulhos, na Grande SP, para vender café da manhã numa movimentada avenida comercial da Zona Sul de São Paulo.

“Fui para a rua por que fiquei desempregado e não tinha outra opção”, conta Reginaldo.
Ele começa a trabalhar antes de o sol nascer. Na madrugada, vende principalmente para motoristas de táxi e de aplicativos. Além da clientela fiel, outros cinco ambulantes compram suas tortas e pães de queijo para revender em outros pontos da cidade. Ele ganha uma média de R$ 150 por dia.

O ambulante já chegou a ter 70% de lucro, mas hoje está nos 50% porque muitos dos ingredientes subiram de preço, como ovos e farinha de trigo. Reginaldo recebe a ajuda da cunhada Vitória Cristina da Silva, de 22 anos, que vende com ele na rua. Sua mulher, que prepara a comida, é ajudada por duas primas.

Quando consegue vender bem, Reginaldo chega a pagar para cada uma das ajudantes R$ 1,2 mil por mês. “Não tenho do que reclamar da rua”, afirma. O sonho do vendedor é abrir sua própria lanchonete e, quando isso acontecer, ele pretende levar a cunhada para trabalhar para ele.

“Quero comprar um lugar. Se não der certo, eu fecho e volto para a rua. A gente tem que arriscar”, comenta o vendedor ambulante.
Os filhos de 8 e 14 anos estudam em escola pública. A família mora em casa própria, mas não tem plano de saúde.

4 vezes menos produtivos
Além de ter ajudado a derrubar a produtividade nos anos de crise, o aumento da informalidade está afetando a lenta recuperação da economia, concluiu um estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV).

Segundo o economista Fernando Veloso, um dos autores do estudo, a produtividade do trabalho no setor informal é quatro vezes menor que no mercado formal.

“As empresas formais são mais produtivas porque têm acesso a crédito, trabalham em escala e podem expandir seus negócios sem problemas de fiscalização da Receita”, explica ao G1.
Já os empregadores informais, completa o economista, não recolhem impostos e contribuições que aumentam a arrecadação de dinheiro público e costumam contratar trabalhadores com qualificação mais baixa. Com isso, a renda tende a ser menor e isso impacta o consumo, um dos pilares da atividade econômica.

Informais ganham 40% menos
O rendimento médio de um trabalhador sem carteira assinada era quase 40% menor que o de um registrado, segundo o IBGE. No segundo trimestre deste ano, a empregado formal ganhava em média R$ 2.099, enquanto o informal, R$ 1.313.

“É evidente que para um desempregado é melhor conseguir uma ocupação informal do que nada, mas a informalidade é uma coisa muito ruim. Para a maioria das pessoas é uma estratégia de sobrevivência”, explica o professor da faculdade de economia da USP, Hélio Zylberstajn.

Nos anos de crise, 46% da queda da produtividade deveu-se ao aumento do mercado informal, segundo o IBRE.
Entre 2014 e 2017, o mercado de trabalho ficou 3,6% menos produtivo. Deste total, 2% resultaram da menor eficiência das empresas e 1,6%, do aumento do emprego em empresas com baixa produtividade.

Para Veloso, do IBRE, a produtividade das empresas tende a ganhar mais importância no padrão de vida das pessoas com a redução gradual do bônus demográfico, que levará a uma queda da população economicamente ativa.

“A população com idade de trabalhar vai passar a crescer menos que o número de idosos fora do mercado e, a partir daí, a única forma de aumentar a renda das pessoas será com o aumento da produtividade”, avalia Veloso.

Efeitos para a economia
Um estudo do Credit Suisse de julho deste ano, assinado pelos economistas Leonardo Fonseca e Lucas Vilela, aponta que a dinâmica do PIB está mais ligada à população ocupada no trabalho formal do que na informalidade.

“Para a retomada do mercado de trabalho ser sustentável nos próximos trimestres, a atividade econômica precisaria crescer mais consistentemente”, conclui o estudo.

Para Veloso, do IBRE, o aumento da informalidade é um reflexo da própria crise, mas há também fatores estruturais que limitam o crescimento das empresas formais, como a complexidade da carga tributária e a dificuldade na concessão de crédito.

 

Fonte: G1