Muitas empresas brasileiras tiveram de recorrer a uma medida extrema para evitar a falência, que é pedir recuperação judicial. A medida nada mais é do que um respiro que a legislação brasileira permite a uma companhia para tentar se reerguer, renegociando suas dívidas e, às vezes, até desenhando um novo plano de negócio.
Mas um número muito baixo de empresas consegue ter sucesso nesse processo. Entre os raros casos está a Eneva, a antiga MPX, que saiu do legado de Eike Batista e precisou deixar de ser uma empresa do grupo “x” para se recuperar. Com quase 2,5 bilhões de reais em dívidas, a companhia de energia elétrica anunciou o fim do processo de recuperação judicial em junho de 2016, após cerca de um ano e meio.
Em novembro deste ano, a OSX, outra empresa ligada a Eike, anunciou a sua saída da recuperação judicial. Suas ações quase triplicaram de valor após o anúncio, saindo de R$ 10,51 para R$ 30,35 em dois dias, mas o papel já devolveu parte dessa alta e é negociado atualmente a menos de R$ 20. No auge de Eike Batista, a ação chegou a ser negociada a R$ 2.860, em março de 2010. É uma incrível queda de 99,3% no preço dos papéis. Apesar de ter saído da recuperação judicial, a empresa reportou um prejuízo líquido de mais de R$ 240 milhões em seu último balanço.
Continuando na seara das empresas do grupo x, a companhia de mineração MMX segue na lista da B3 que contém 22 empresas com pedido de recuperação judicial em andamento. As ações da companhia foram literalmente do céu ao inferno, despencando de R$ 8.850 em junho de 2008 para menos de R$ 2 em setembro deste ano, uma queda de 99,98%. Cada mil reais investidos na empresa no auge da sua cotação na bolsa viraram dois centavos.
Em outubro, as ações tiveram uma alta de mais de 1.500%, saindo de R$ 2,20 para R$ 36, em apenas uma semana, o que despertou um alerta na CVM, que questionou o motivo da oscilação atípica no valor da cotação, sem nenhuma causa aparente. Desde então, a ação já caiu mais de 50%, para cerca de R$ 16.
A MMX atribui essas oscilações ao fato relevante divulgado sobre a requisição feita à justiça para a retomada da mina Emma. A referida mina foi arrendada para a empresa vetorial em 2014 e, se retomada, poderia potencializar a capacidade operacional da MMX para a venda de minério de ferro.
Segundo a companhia, isso viabilizaria a sua recuperação judicial, mas a empresa que detém a posse legal de toda a lavra da mina afirmou que não havia razões para o pedido da MMX. Apesar das oscilações no valor das ações, a empresa continua em recuperação judicial e não possui nenhuma operação.
As ações de empresas em recuperação costumam ser mais suscetíveis a quedas ou altas repentinas. Como são empresas pouco negociadas, com baixa liquidez, notícias ou fatos sobre elas costumam aumentar a especulação com as ações, o que causa a volatilidade.
Assim como a MMX, outras 21 empresas listadas na bolsa estão em processo de recuperação judicial. A Livraria Saraiva teve um efeito semelhante à MMX quanto à alta de suas ações. No ano passado, os papéis chegaram a subir 226% em apenas um dia, após uma notícia sobre a saída do seu então CEO, Jorge Saraiva Neto.
Mas os riscos de comprar ações de empresas em recuperação judicial podem ir além da capacidade de elas se recuperarem ou não. Elas são muito pouco negociadas e, portanto, têm baixíssima liquidez. Com exceção dos papéis da Oi, que são muito populares entre os pequenos investidores. A empresa de telecomunicações é a única da lista com média de negociação diária acima de cinco milhões de reais.
A Oi protocolou o pedido de recuperação em junho de 2016 e só conseguiu aprovar o plano em dezembro de 2017. É a segunda maior recuperação judicial da história no país, atrás apenas da Odebrecht, e a maior entre as empresas com capital aberto. Na época, a empresa disse ter uma dívida de mais de R$ 65 bilhões. Recentemente, a Oi recebeu um desconto de 50% na dívida com o governo, que é de 14 bilhões de reais. O valor se refere a mais de mil multas aplicadas pela Agência Nacional de Telecomunicações, a Anatel, na última década.
No último balanço, a Oi apresentou um prejuízo líquido de mais de 2,6 bilhões de reais no terceiro trimestre. Apesar de negativo, representa uma queda de 54% em relação a 2019. Ela tem vendido parte de suas operações, como a de telefonia móvel e as suas torres de celular, para pagar parte das dívidas e ter dinheiro para investir nos negócios restantes, que têm maior futuro. É um futuro ainda incerto, mas que tem apresentado algum resultado nos últimos meses.
Outra empresa do ranking é a Eternit. A empresa entrou com o pedido em março de 2018, mesmo sendo questionada por credores pelo seu balanço financeiro não condizer com um pedido de recuperação judicial. Eles diziam que a empresa tinha condições de pagar suas dívidas e protocolou o pedido “sem estar respirando com a ajuda de aparelhos”.
A Eternit é uma das marcas mais tradicionais do setor de materiais de construção. Com a proibição do amianto, matéria prima para a fabricação de suas telhas e fonte de exportação para outros países, a empresa tentou insistir na justiça brasileira para que a substância, considerada cancerígena, não fosse proibida. Mas dezenas de outros países também vetaram a substância, o que afetou as suas exportações. Enquanto a Eternit não queria abrir mão do amianto, seus concorrentes migraram para materiais alternativos.
Recentemente, a empresa apresentou uma telha fotovoltaica, capaz de transformar luz solar em energia elétrica. O novo produto deve começar a ser vendido só daqui a 12 ou 18 meses. Mas, após a divulgação do lançamento dessa nova telha, a ação da empresa subiu 72% no dia 27 de agosto e fechou cotada a R$ 3,60. Desde então, as ações continuaram subindo e já superaram a casa dos R$ 17.
Além da mudança de foco da Eternit, para uma economia sustentável e concentrada em novas tecnologias, a alta também pode ser explicada pela demanda aquecida do setor de construção. É mais um movimento especulativo dos investidores, que apostam na saída da crise e se posicionam antes do fato para lucrar com a valorização dos papéis. Mas agora essa alta ficou mais limitada, pois o valor máximo das ações até hoje foi R$ 36 em dezembro de 2010.
Na outra ponta, tem empresas que, além de estarem em processo de recuperação, foram duramente afetadas pela pandemia. É o caso da Teka, uma das mais tradicionais indústrias têxteis do país. Com o fluxo de caixa comprometido, a companhia precisou acionar a justiça para impedir o corte de energia elétrica e renegociar o pagamento de faturas atrasadas.
É bom frisar que toda recuperação judicial, como o próprio nome diz, serve para recuperar a empresa e tentar evitar a falência – o que infelizmente nem sempre acontece. Na falência, a companhia encerra completamente as suas atividades e todos os seus ativos são leiloados pela justiça para pagar as dívidas da empresa. Na recuperação existe uma negociação com os credores para tentar evitar esse ato extremo.
Fonte: Invest News