O mercado de capitais brasileiro vive um ano atípico em 2020. E não por causa da pandemia. Segundo dados da B3 e da Associação Brasileira das Entidades dos mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), o volume captado por meio de emissões de ações ampliou ainda mais neste mês o recorde já atingido em outubro. A captação por meio de operações com renda variável passa de R$ 101 bilhões em 2020, ou seja, em 11 meses incompletos supera em R$ 11,4 bilhões o volume obtido no ano de 2019 inteiro.
Sem considerar 2010, que contou com a megacapitalização da Petrobras, de R$ 120 bilhões, as emissões de renda variável em 2020 também ultrapassam pela primeira vez a casa dos R$ 100 bilhões. Uma década atrás, fora a operação da petroleira, as empresas do país captaram pouco menos de R$ 30 bilhões no mercado doméstico de ações.
O valor levantado neste ano vai crescer ainda mais. Isso porque a oferta inicial (IPO) da Rede D'Or, que está em fase de precificação, deve trazer até R$ 12 bilhões para essa conta. Com isso, 2020 já esbarraria nos R$ 113 bilhões em captação por meio de ofertas de ações. Isso sem considerar outras operações que podem sair até o fim do ano.
No total, até novembro foram 25 IPOs contra cinco ao longo de 2019. Em 2020, a captação via aberturas de capital alcançaram R$ 31,7 bilhões, sem considerar a operação da Rede D'Or. O volume é 223% superior ao do ano passado.
Em termos de volume financeiro das ofertas iniciais de ações, 2020 já ocupa o segundo lugar entre os melhores anos para as operações. No quesito quantidade, 2020 também tende a superar 2006, que teve 26 aberturas. O momento atual só perde para 2007, que contabilizou 64 IPOs e uma captação nominal de R$ 55 bilhões.
Segundo o diretor de relações com investidores da B3, Felipe Paiva, as novas companhias na bolsa acrescentaram mais de R$ 90 bilhões em valor de mercado até o momento. Além da demanda por IPOs, o executivo destaca o crescimento da base de investidores em ações. As pessoas físicas, por exemplo, saltaram de quase 1,7 milhão no fim de 2019 para 3,14 milhões neste ano.
A quantidade de cotistas em fundos de ações também vivenciou avanço semelhante. Segundo dados da Anbima, até novembro o grupo alcança 6,355 milhões, um salto de 1,7 milhão comparado ao fim de 2018.
Chuva de dinheiro verde e amarelo
Para o presidente da B3, Gilson Finkelsztein, o crescimento tem sido impulsionado pelos investidores brasileiros. Os locais “assumiram protagonismo na absorção das ofertas de ações”. O grupo de agentes domésticos ficou com cerca de 70% dos IPOs e follow-ons até outubro ante 30% dos estrangeiros, segundo números da Anbima.
Na visão da diretora de relações com emissores da B3, Flávia Mouta, não só os volumes foram significativos, como houve diversificação de segmentos, com incorporadoras, empresas de varejo, drogarias, empresas de tecnologia e outros perfis chegando à bolsa.
Para ampliar a base de emissores, a diretora diz que o ponto de partida é a modernização de instrumentos financeiros para facilitar o acesso de pequenas e médias ao mercado de capitais. “A gente sabe que as empresas menores precisam de regras mais simplificadas, seja no processo de oferta ou na redução do custo de observância.” A executiva acrescenta ser necessário manter o equilíbrio, incorporando governança às companhias novatas.
A diretora da B3 exemplifica entre as ações já adotadas a retirada do piso para acesso ao Novo Mercado da bolsa, que era de R$ 500 milhões. “Como resultado, a gente teve neste ano mesmo ofertas iniciais na faixa de R$ 200 milhões a R$ 400 milhões.” Para efeito de comparação, a executiva diz que a média dos IPOs no mercado brasileiro se situa em R$ 2 bilhões por operação.
O vice-presidente da Anbima, José Carlos Laloni, acrescenta ainda que os investidores institucionais começam a olhar também novas teses dentro do mercado acionário. “Outra coisa que a gente está vendo acontecer é o interesse dos gestores de renda variável por histórias de crescimento rápido e por empresas menores.”
Fonte: Valor Investe