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Gestores de fundos multimercados reduzem exposição à renda variável

Segunda, 17 Agosto 2020

O risco político e fiscal que tem pressionado a bolsa brasileira nos últimos dias desenha um quadro que deve guiar o mercado local nas próximas semanas. Gestores de fundos de investimento multimercados afirmam que, enquanto não houver diretrizes mais claras sobre qual será o caminho trilhado pela equipe econômica, além do contexto da crise causada pelo coronavírus, não há como reforçar as apostas na bolsa brasileira.

O Valor conversou com sete gestoras de investimentos — BlueLine, BV Asset Management, Garde Asset, Garín Investimentos, Macro Capital, Trafalgar Investimentos e Western Asset — e as estratégias atuais vão desde redução de 30% para zero em bolsa, até alocação no exterior, aumento do caixa e proteções em mercados de juros, câmbio e derivativos.

“O risco político vinha melhorando até o fim de julho, mas nesse começo de agosto esses barulhos de prorrogação dos benefícios, quebra do teto dos gastos e a saída de pessoas da equipe do [ministro Paulo] Guedes trouxeram uma certa insegurança”, afirma Leonardo Morales, gestor de renda variável da Macro Capital.

Atualmente, 30% do fundo da gestora está alocado em renda variável, sendo cerca de 15% no índice Russell, 10% em Eurostoxx e 5% na bolsa brasileira.

O que tem estressado os mercados são sinalizações vindas do governo de que o teto de gastos pode ser rompido em 2021. O presidente Jair Bolsonaro chegou a admitir que existe essa discussão no governo, mas logo depois voltou atrás e esclareceu que Paulo Guedes manda no orçamento.

Manter os gastos públicos sob controle e ter uma agenda liberal é a estrutura desejada pelo mercado financeiro para a retomada do crescimento econômico e dos investimentos. A saída de Salim Mattar e Paulo Uebel das secretarias de Desestatização e Desburocratização trouxeram dúvidas em relação a isso.

Luiz Sedrani, diretor de Investimentos da BV Asset, explica que o crescimento da economia brasileira é uma pauta importante, mas que o governo tem muitos caminhos. “Para que lado vai é uma discussão. O mercado estressa toda vez que fica claro que a disputa política está ganhando do lado de maiores gastos públicos”, disse.

Esse é um dos riscos atuais, além dos impasses entre China e EUA e as eleições americanas, segundo Sedrani, o que leva a gestora a manter uma postura de cautela, apesar de acreditar que a bolsa brasileira tem potencial de apreciação. Hoje, entre 15% e 20% do risco dos fundos multimercados geridos pela BV estão em bolsa e protegidos com contratos de opções. No início do ano, esse patamar era superior.

Na Garde Asset, a estratégia adotada foi aumentar o nível de caixa para até 30% e reduzir a parcela em bolsa, que passou de 20% para 10% nos últimos 30 dias. “Estamos no ponto intermediário da nossa faixa de alocação, achamos mais prudente fazer isso diante do cenário de riscos. A elaboração do orçamento e toda essa parte fiscal pode mudar muito no ano que vem”, diz Marcelo Giufrida, CEO da Garde Asset.

Outras razões que explicam sua decisão é o atual nível de preços dos ativos após o rali recente e a proximidade da eleição americana.

Giufrida diz que, por enquanto, não pretende usar o caixa para comprar novos ativos. “A maneira clássica de se proteger aqui no Brasil é reduzindo posição para fazer mais caixa e neste momento optamos por reduzir o risco desta maneira.”

Aumentar o caixa e esperar por oportunidades é também a estratégia atual da Trafalgar Investimentos. Após um período de maior exposição ao risco, com 30% dos recursos em bolsa em abril e maio, a gestora zerou em junho e passou para 40% em moedas emergentes.

Agora, em agosto, a maior parte está no caixa, mercado de juros, 3% em ações de mineradoras e petroleiras fora do Brasil e uma pequena parte em opções de venda (put) em Nasdaq. “Fizemos as últimas reduções de risco basicamente olhando a perspectiva política mais nebulosa”, diz Ettore Marchetti, sócio e responsável pelas estratégias de câmbio e renda fixa.

Já a BlueLine Asset Management reduziu para 15% a exposição à bolsa, levando a maior parte dos recursos para bolsas EUA e Ásia. Antes, o Brasil correspondia a cerca de 50% da exposição do fundo à renda variável, que está entre 20% e 21%.

“O Ibovespa já chegou perto dos 105 mil pontos e setores que a gente gosta já andaram bem. Vale a pena uma rotação geográfica”, diz, acrescentando que a mudança ocorreu nos últimos 15 dias. Na carteira da BlueLine ficaram apenas cinco ações e daquelas empresas com boa gestão e capacidade “de navegar em águas turbulentas”.

Em relação às estratégias de proteção, a que combina compra de ações e defesa em dólar surge entre as opções do gestor de portfólio Gustavo Baltar, da Western Asset, bem como juros futuros e “long & short” — venda (short) de uma ação para compra (long) de outra ação ao mesmo tempo.

“Se voltarmos seis meses no tempo, no início do ano o fundo multimercado estava 35% comprado em Ibovespa; com a pandemia isso caiu para 5%. Agora, mantemos algo entre 10% e 15%”, disse.

Ivan Kraiser, gestor da Garín Investimentos, também chegou a usar o câmbio para atuar na bolsa, mas ressalta que hoje é uma estratégia cara. Atualmente, ele mantém 5% no mercado à vista. “As minhas posições em bolsa são naqueles setores que acho que ainda mantêm um bom preço ou são mais defensivos.”


Fonte: Valor Investe