Os investidores estrangeiros ficaram com 36% das ofertas de novas ações (IPOs e “follow-ons”) realizadas em 2020 na bolsa brasileira, o equivalente a R$ 14 bilhões. Já os investidores institucionais foram os maiores participantes, com 44% ou R$ 17,37 bilhões.
No total, os IPOs e follow-ons movimentaram R$ 39,26 bilhões, conforme dados disponibilizados pela B3 até o início de julho.
A participação dos estrangeiros neste ano é, até o momento, inferior à observada em 2019, de 44%. Já a dos institucionais foi de 46%.
Os dados da B3 de 2020 não contabilizam ainda o IPO da Ambipar, de R$ 1,082 bilhão, e a oferta da Lojas Americanas, de R$ 7,9 bilhões.
Para os próximos meses, a perspectiva é positiva para novas ofertas, o que, segundo especialistas, deve amortecer a valorização do Ibovespa, a medida que parte do fluxo deve ser destinado para essas operações. Além disso, com mais papéis ofertados, o aumento da demanda por ações será suprido, sem que haja um grande impacto sobre os preços.
Analistas também observam que o ajuste de carteiras influenciará na valorização, já que alguns investidores tendem a vender papéis no mercado secundário para participar do primário.
Na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), há 20 pedidos de IPOs em análise. O próximo deve ser do Grupo Soma, dono de marcas de roupas como Animale e Farm, com precificação no dia 29.
David Beker, chefe de economia e estratégia do Bank of America (BofA) no Brasil, explica que a expectativa é elevada para a bolsa brasileira, que terá um aumento da alocação de recursos diante da baixa da taxa de juros (Selic) — atualmente em 2,25% ao ano. “É exacerbado, porque a Selic nunca esteve tão baixa, e esse fluxo vai acontecer. Mas essa demanda elevada será amortecida pelas ofertas. Se não tivesse, subiria muito a bolsa”, diz.
Segundo Beker, entre 12% e 13% dos recursos da indústria de fundos de investimento estão em ações. Esse mercado corresponde a algo em torno de R$ 5 trilhões. Desta forma, a cada 10% de movimento de alocação, são R$ 500 bilhões migrando para ações.
A própria retomada recente do Ibovespa, de 64,3% desde o piso dos 63 mil pontos até 104.426 pontos no fechamento desta segunda — avanço de 1,49% no dia — é o que desperta o interesse das empresas para acessar o mercado de ações.
“É um reflexo dos fluxos, porque há demanda por ações. O mercado global está com apetite ao risco, estimulado pelos bancos centrais. Aqui dentro, os indicadores têm sido um pouco melhores e o ruído político diminuiu.”
Na visão dele, a retomada da bolsa mostra que as empresas podem conseguir preços melhores para suas ações. Além disso, o cenário está menos nebuloso em relação aos impactos econômicos da pandemia. “Como existirão mais ações, vai subir de forma mais lenta.” O cenário mais otimista do BofA estima o Ibovespa em 110 mil pontos em 2020.
A troca de posições é um dos efeitos no Ibovespa da perspectiva positiva para IPOs e follow-ons, segundo Álvaro Bandeira, sócio e economista-chefe do banco digital Modalmais. “Os investidores podem vender no mercado secundário algumas ações para participar do lançamento de papéis.”
Atualmente, de acordo com Bandeira, a troca de posições está sendo constante, sem muito dinheiro novo entrando no mercado. “O investidor vende aquele papel que subiu muito e parte para um papel mais barato”.
O estrangeiro é um exemplo, de acordo com Bandeira, de investidor que mantém o apetite por Brasil, mas nas ofertas novas. Enquanto o estrangeiro entrou com R$ 14 bilhões no mercado primário, já sacou R$ 82,7 bilhões do secundário em 2020, até o dia 16 de julho.
Para Marcela Morais, membro da equipe de gestão da ARX Investimentos, novas ofertas têm, tecnicamente, o efeito de limitar a valorização prevista para o Ibovespa. Mas, até o momento, o volume não é suficiente para atender toda a demanda. “Hoje há espaço suficiente para novos papéis e para continuar a demanda nos papéis já negociados na bolsa”, diz, acrescentando que se o volume ultrapassar os R$ 50 bilhões, então um impacto mais efetivo pode ocorrer.
Para Morais, a demanda elevada nas ofertas já realizadas prova essa tese de que “há espaço” para todos.
No caso do IPO mais recente, da Ambipar, o preço ficou no topo da faixa indicativa, em R$ 24,75. Já na oferta da Lojas Americanas a alta demanda permitiu a alocação do lote adicional.
Segundo Jorge Oliveira, sócio responsável pela área de ações da BlueLine Asset, o sucesso de algumas ofertas foi devido ao perfil da empresa. No caso da Ambipar, a demanda ocorreu por se tratar de uma companhia de prestação de serviços ambientais. Assim, atendeu os fundos ESG, de melhores práticas ambientais, sociais e de governança. “O estrangeiro teve interesse pelo negócio em si e a oferta caiu como uma luva.”
No caso do follow-on da Americanas, Oliveira diz que a demanda ocorreu pelo potencial de crescimento do comércio eletrônico.
Fonte: Valor Investe