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A depressão pandêmica está no caminho certo

Quinta, 09 Julho 2020

O coronavírus derrubou os índices de produção e emprego dos EUA. Esta queda, contudo, era uma função do software, e não um defeito. Como eu venho dizendo há algum tempo, nós intencionalmente pusemos a economia no equivalente médico de um coma induzido, suprimindo atividades para ter uma chance de pôr a pandemia sob controle.

Se tivéssemos continuado neste caminho, este período de dor poderia ter preparado o cenário para uma rápida recuperação americana. Mas desde o início, era óbvio que este péssimo manejo da situação – com o fracasso em manter a disciplina do distanciamento social, fracasso em usar este tempo para desenvolver testes suficientes e rastreamento de contato que permitisse retomar a vida normalmente ao mesmo tempo em que se continham novos surtos – poderia ampliar a dor, transformando uma recessão curta e aguda em depressão prolongada, um período extenso de desemprego bastante elevado.

Eis como eu descrevi este cenário de pesadelo mais de seis meses atrás: “Nas próximas semanas, muitos Estados vermelhos (cor do Partido Republicano) abandonam políticas de distanciamento social, enquanto muitos indivíduos, seguindo as orientações de Trump e da Fox News, começam a se comportar de maneira irresponsável. Isto leva, por um período curto, a uma certa alta no número de empregos.

“Mas logo mais fica claro que a covid-19 está fugindo ao controle. As pessoas voltam para suas casas, não importa o que digam Trump e os governadores republicanos.”

Bem, não é mais um cenário de pesadelo; é só a realidade. A região de Nova York, após um início terrível, vem fazendo o que a maioria dos países desenvolvidos têm feito, e esmagou a curva. Porém, agora a covid-19 está explodindo no Cinturão do Sol (regiões Sudeste e Sudoeste dos EUA). O Arizona está em crise total. O Texas idem, em particular cidades grandes como Houston, onde as internações estão disparando. A Flórida, que vem segurando dados de internações, provavelmente vive algo parecido.

Os três Estados têm governadores republicanos que animadamente revogaram ordens para ficar em casa e, no Arizona e Texas, no início chegaram a impedir os governos locais de exigir das pessoas que usassem máscaras. Enquanto escrevo isso eles continuam hesitando, dando passos tímidos no sentido de retomar o distanciamento social à medida que a pandemia segue sem trégua.

De um ponto de vista econômico, contudo, talvez não faça diferença o que os governadores desses Estados decidam: é provável que o medo do coronavírus adie a recuperação, e talvez até mesmo mande esses Estados de volta a uma recessão, mesmo que não haja outro lockdown. Como têm feito muitos economistas ultimamente, eu tenho usado as reservas de restaurantes registradas pelo site OpenTable como um primeiro sinal de alerta de mudanças econômicas. O que os dados mostram é uma retomada significativa no número de jantares fora de casa durante maio e começo de junho, com paralisação e talvez até mesmo recuo nas últimas semanas.

Isso nos diz, entre outras coisas, como reagir ao relatório de empregos de 2 de julho, que mostrou que as folhas de pagamento americanas cresceram 4,8 milhões em junho, segundo mês de ganhos após perda de mais de 20 milhões registrada em abril. É um espasmo de gato morto, que reflete os efeitos da reabertura inicial, mas não os efeitos da alta em infecções que veio em seguida.

Durante meses, epidemiologistas e economistas vêm tentando dizer aos legisladores e empresários que não se trata de combater a epidemia ou promover crescimento econômico. Isto é, se nós não controlarmos a covid-19 nos EUA, qualquer ganho de curto prazo vai desaparecer logo depois, e nós podemos nos ver no pior dos dois mundos – mais mortes junto com estagnação econômica. Só que essa mensagem foi ignorada, de modo que cá estamos nós.

Autor: Paul Krugman - Economista, vencedor do Prêmio Nobel em 2008. É professor da Universidade de Princeton
Fonte: Exame